Era tarde de Maio, espaço rubro onde
nem uma ideia ondulava, só o pensamento
em paz, perdido na sua sombra. (Chamas-me
de volta, roubando-me à sombra que me procura,
e que o tempo não rompeu, insistindo
em erguer-se como gigantes do apocalipse).
Gotas de terror despenhavam-se num mar
imenso, como se de repente o ar se tivesse
tornado louco, fechando o girassol numa
inquietadora visão; fogo cruzado avançava
de encontro a nós, líquido ou espesso,
vomitando lava, cujo pranto nos
deixava petrificados. Debaixo do cruzeiro
lia o terror nos teus olhos; pânico e pavor
em todas as pregas do teu corpo, tombado
no chão, em prece, e inerte num rio de escuridão.
Então caiu-me em mãos o teu rosto, acossado,
ferido pelos raios da solidão, teu corpo magoado,
um olhar invisível, parado, a estrangular o infinito.
A porta de todos os abismos.
Disse teu nome em sussurro (meu Deus)
nesse mar que me cercava. Em casa
nem um murmúrio, nessa tarde tão funesta.